Estudar a evolução da moda através dos séculos é fascinante mas nada até hoje na história humana se compara ao surgimento do fast fashion. Para a imensa maioria das pessoas a verdadeira extensão do impacto dessa indústria que vende bilhões de roupas baratas todos os anos parece ser algo abstrato, pois toda a infraestrutura necessária para que ela funcione é realmente algo fora do normal. Por exemplo, em 2014, o mercado global de vestuário movimentou US $ 1,4 trilhões.

Existem três grandes regiões que dominam o consumo global com destaque para apenas dois países. América do Norte, Ásia e Europa Ocidental representam anda menos que 80% do consumo mundial de produtos de vestir, sendo que apenas Estados Unidos e China representam 38% disso.

O mercado vem crescendo consistentemente desde a crise de 2008, porém não em uma velocidade igual aquela apresentada pelo setor de saúde e beleza. O crescimento do mercado é pautado, sobretudo, pela expansão do consumo asiático de dois países: China e Índia. Os Estados Unidos deixaram de ser o maior mercado de moda do mundo, enquanto mercados tradicionais como Alemanha, Reino Unido, Itália e França não apenas estagnaram, mas passaram a encolher pela queda consistente de preços que assola o mercado mundial.

Contudo, o crescimento ainda acelerado da China aponta um esfriamento do mercado, pois este já vinha crescendo a dois dígitos por mais de uma década e especula-se que as cidades principais já estejam saturadas, tanto o é que empresas como Inditex, H&M, Forever 21, GAP e Adidas estão focando esforços em regiões menos desenvolvidas e a estratégia de entrada parece ser apenas uma: abertura de lojas e descontos agressivos. Mas o que isso realmente significa? O que isso nos diz sobre o nosso comportamento como consumidores, especialmente no contexto da moderna indústria do fast fashion?

Bem, aqui está uma breve cronologia de como o fast fashion surgiu:

1900 – 1920:

Antes da década de 1900, as roupas de alta qualidade era um luxo, porque elas só poderiam estar disponíveis através de costureiras. Pelos anos 1900 no entanto, a máquina de costura se tornou relativamente comum, e a primeira fábrica de moda pronta tornou-se disponível nas lojas de departamento. Roupas masculinas decentes podiam ser compradas a partir destas lojas, mas ainda havia uma profunda divisão entre a moda européia de qualidade adquirida pelos ricos e os frágeis itens chamativos, disponíveis para todos os outros. Assim, para as fashionistas da época, era simplesmente mais barato fazer seus próprios vestidos.

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Vestidos eram um luxo antes de 1900 e, portanto, a moda era principalmente apenas para os ricos.

1930 – 1940

Em 1929, o homem americano médio tinha seis peças de roupa para trabalhar, enquanto a média das mulheres americanas era nove. Durante a Grande Depressão da década de 1930, tudo que era “fashion” foi posto de lado, e portanto, era preferível reparar as roupas do que comprar novas. Os anos 1940 foram marcados pelos anos da Segunda Guerra Mundial, onde as mulheres começaram a entrar no mercado de trabalho, e de repente, surgiram com um novo poder de compra.

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1930 – 1940 roupas práticas e resistentes sublinhavam a funcionalidade em vez da beleza.

1950 – 1960

Na década de 1950, a qualidade da moda feita à mão tornou-se acessível para a classe média. A indústria de vestuário da América floresce tremendamente com moda feminina como seu bestseller. Com a ascensão das celebridades como Twiggy e The Beatles, a posição da moda tornou-se extremamente importante. Materiais sintéticos tais como PVC, poliéster, também entraram para o mainstream na década de 60, criando uma revolução que mudou para sempre a maneira como as mulheres se vestiam. Muitas empresas de moda também surgiram no mercado durante a década de 1960, e a indústria têxtil deslanchou.

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A década de 1950 trouxe de volta o “New Look”, que enfatizava a figura mais completa e mais tecido para criar.
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O ícone do estilo Twiggy, que representou os rebeldes revolucionários dos anos 60.

1970 – 1980

Nos anos 1970 e 1980, houve uma mudança na indústria de fabricação de tecidos. Como os preços de produção aumentaram, muitas empresas optaram por mover suas fábricas para a Ásia em vez disso, as quantidades poderiam ser aumentadas e os salários poderiam ser mais baixos. Hong Kong também começou seu boom indústria têxtil durante este período. O vestuário ficou mais barato, mas a publicidade tornou-se mais cara. O ciclo sazonal da moda Primavera / Verão e Outono / Inverno também foi introduzido durante este tempo.

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Os anos 70 foram uma época gloriosa para as estampas, PVC e poliéster
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Uma fábrica de algodão em Hong Kong durante os anos 70.

1990 – 2000

Os anos 1990 foram marcados por uma demanda ampliada para a moda. Como as nações em desenvolvimento viram-se de repente com a capacidade de tomarem-se parte nas tendências da moda mundial, as grandes empresas de moda viram estas novas oportunidades e aproveitaram. Assim começou a colonização global da moda, onde as marcas estrangeiras entraram nos mercados locais com milhões para gastar em publicidade e marketing, destruindo no processo pequenas boutiques e marcas locais.

À medida que os mercados cresceram, o apetite para a moda também cresceu. Todo o processo de fabricação já não podia se dar ao luxo de levar 4 meses desde a concepção para a venda no varejo, e toda a cadeia de produção teve que ser encurtada. Milhares de modelos agora são apresentados semanalmente, com milhões de peças de vestuário são feitas todos os meses principalmente por mulheres em países em desenvolvimento as quais trabalham em turnos de 16 horas por dia. Toda a produção agora pode levar apenas 3 semanas, não precisando mais aderir aos ciclos sazonais da moda tradicionais.

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A fábrica chinesa moderna
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Enormes multidões em lojas de departamento na China

2000
Para sobreviver neste mercado competitivo, os varejistas de vestuário de moda deve sempre se esforçar para serem os mais rápidos a lançar novos produtos para encher as prateleiras. Contudo, para alcançarem tal velocidade, a qualidade e a ética de todas as peças de vestuário deve ser comprometidas. Nas lojas, os enormes cartazes escrito PROMOÇÃO ou ESTOQUE LIMITADO, transmitem a noção de que talvez da próxima vez que você passar nesta loja, a peça que você desejava já terá sido vendida, criando um senso de urgência que nos impulsiona a “comprar mais e pensar menos”.

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Turistas chineses fazendo filas na porta da Hermes em Paris

Atualmente

A maioria das consumidoras do sexo feminino estão muito ocupadas trabalhando ou cuidando de suas famílias, e têm pouco conhecimento de costura, o que as leva, infelizmente, para longe de qualquer habilidade para valorizar a qualidade de algo artesanal.

Combinada com a capacidade da indústria da moda de criar desejo sobre coisas sem sentido através do marketing, as mulheres geralmente estão dispostas a comprar qualquer item com um rótulo que elas reconheçam, desde que isso seja acessível para compra. A originalidade foi substituída por uma versão barata mais acessível. Assim o fast fashion, como fast food, sinalizou a morte do estilo e do bom gosto para as massas.

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Armários abarrotados de roupas mostram esse comportamento insano de consumismo sem consciência.

A indústria da moda se tornou um negócio de trilhões de dólares em que os empresários e investidores procuram formas de reduzir seus custos ao máximo e aumentar a receita para os acionistas. A melhor maneira de fazer isso é produzir e vender enormes quantidades de produtos para o mercado de massa. Esta equação de fazer volumes altos exige um enorme investimento que aumenta imensamente o risco, um risco de que a maioria dos acionistas não gostariam de assumir.

O que significa que os riscos devem ser reduzidos, mantendo a margem de lucro constante. Quem é que paga por isso? Nós, os consumidores que pagamos o mesmo preço pela metade da qualidade; os trabalhadores, que têm que fazer o dobro do trabalho pelo mesmo salário; e o ambiente, que é fortemente fertilizado com produtos químicos para produzir maiores colheitas e as águas dos rios, lagoas e mares que são poluídos pelas tinturarias e tecelagens. Isso soa familiar? Estranhamente, a recessão do varejo de moda parece estar coincidindo com a crise das hipotecas sub-prime de 2008.

Dessa forma, só os mais ricos podem pagar e experimentar as roupas de maior qualidade e durabilidade, enquanto a grande maioria da população tem que se contentar com roupas de baixa qualidade produzidas pelas grandes redes de fast fashion que irão em breve parar nos lixões.

Esta epidemia de “roupa descartável” está agora se espalhando por todo o mundo, para países em desenvolvimento que querem as mesmas coisas que os Estados Unidos e outras nações ocidentais estabeleceram, deixando todo o conhecimento e as tradições da tecelagem, fiação e traje cultural irem para o esquecimento.

A mundaça dos consumidores ambientalmente conscientes

Esta tendência, conhecida como “fast fashion” acabou criando pesados danos ambientais para o nosso planeta. Como os prazos de fabricação foram encurtados, o tempo disponível para os produtores de algodão fazerem crescer o algodão também encurtou significativamente, levando os agricultores a usarem toneladas de pesticidas e adubos químicos que tanto drenam e também contaminam as fontes de água circundantes.

Muitos dizem que o fast fashion democratizou a moda e deu condições para que bilhões de pessoas pudessem adquirir uma infinidade de produtos por baixos preços como nunca houve na história humana. Isso é verdade mas a que preço?

Detox: Como a moda está limpando seus atos. O vídeo está em inglês mas se clicar no “ícone cc” e depois no “detalhes” você poderá colocar a legenda em espanhol pois não tem português.

Será que realmente precisamos de toda essa roupa que temos? Pare por um segundo na próxima vez que você passar na frente de uma das lojas dessas gigantes do fast fashion, atraída pelo fascínio do sinal vermelho brilhante escrito PROMOÇÃO … e reflita e pense, será que eu realmente sei o que estou comprando?

Felizmente muitas pessoas estão acordando do transe hipnótico do “canto da sereia” da moda rápida e descartável e estão seguindo a linha ecológica do movimento slow fashion que prega menos consumismo, mais consciência ambiental e mair valorização da moda nacional e artesanal.

Devido a pressão de ativistas do Greenpeace que denunciam periodicamente os abusos da indústria do fast fashion que vão desde a destruição do meio ambiente ao trabalho escravo principalmente de mulheres e crianças em países como China, Índia e Bangladesh, o mundo começou a perceber o real custo da moda barata para a sociedade e para o planeta Terra.

A campanha “Detox na Moda” lançada pelo Greenpeace tem muitos dados reveladores sobre a alta toxidade dos produtos fabricados por essas gigantes da roupa barata e os instiga a mudarem urgentemente seu método de fabricação.

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Renato Cunha
O blog Stylo Urbano foi criado pelo estilista Renato Cunha para apresentar aos leitores o que existe de mais interessante no mundo da moda, artes, design, sustentabilidade, inovação, tecnologia, arquitetura, decoração e comportamento.

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